ÉTHNOS – X – RESUMO - III
ETNOCIÊNCIA - ETNOECOLOGIA - ETNOBIOLOGIA - ETNOBOTÂNICA - ETNOZOOLOGIA - ETNOICTIOLOGIA - ETNOFARMACOLOGIA - FARMACOBOTÂNICA - ETNOTAXONOMIA - ETNOAGRICULTURA - ETNOMATEMÁTICA - ETNOMETEREOLOGIA - ETNOFÍSICA - ETNOHISTÓRIA - ETNOGRAFIA - ETNOENTOMOLOGIA - ETNOMETODOLOGIA - ETNOLINGUÍSTICA.
A Etnociência, com os seus recortes vinculados à Etnoecologia, à Etnobiologia e às suas subdivisões como a Etnobotânica
e a Etnozoologia, tem as suas raízes fundamentadas nas propostas
científicas elaboradas no final do século
XIX, que procuravam registrar uma ampla variedade de utilização de
plantas e animais pelos membros de diferentes grupos culturais.
Porém, foi
somente nas décadas de 1950 e 1960 que a Etnociência
firmou-se como campo do conhecimento, a partir de estudos antropológicos
relacionados com as lógicas de conhecimentos desenvolvidos pelos membros de
grupos culturais distintos (CLEMENT, 1998).
Nesse
período, a Etnociência focalizou os
aspectos linguísticos, classificatórios e taxonômicos de uma determinada
cultura, havendo um desinteresse pela dinâmica das relações que ocorrem entre a
sociedade e a natureza.
Contudo,
existia uma busca pela reconceituação da Etnociência
e de suas múltiplas Etno-X como a Etnoecologia e a Etnobiologia,
que propuseram que o foco dessas ciências fosse direcionado para a diversidade
e a pluralidade da dinâmica das relações que envolvem a sociedade e a natureza
(D'OLNE CAMPOS, 2002).
No entanto, o
termo Etnociência foi
utilizado pela primeira vez nos meios científicos no index do livro The
Outline of Cultural Materials escrito
em 1950 por
George Peter Murdock (1897-1985) e seus
colaboradores Clellan, Ford, Hudson, Kennedy, Simmons e Whiting (CLÉMENT, 1998).
Esse livro
contém um sistema numérico utilizado para categorizar os dados culturais com o
propósito de facilitar a realização de pesquisas de campo com a organização das
informações culturais acumuladas no arquivo denominado Human Relations Area File, que foi inicialmente identificado
como um conjunto de ideias sobre a natureza e a humanidade, que incluía a Etnobotânica, a Etnozoologia,
a Etnometereologia e a Etnofísica (MURDOCK,
1950).
Na década de
1960, a Etnociência
foi caracterizada como um movimento dedicado à revitalização da Etnografia por meio do estudo de sistemas
locais e nativos de conhecimento e cognição, aplicando técnicas analíticas
derivadas principalmente do campo da linguística estrutural para a pesquisa Etnográfica.
Assim, a Etnociência adquiriu uma característica
diferente daquela empregada anteriormente, passando a referir-se aos sistemas
de conhecimento e cognição típicos de uma determinada cultura (STURTERVANT,
1964).
Então, um
determinado grupo cultural pode ser representado pelas próprias classificações
populares, pela Etnociência desse grupo,
principalmente por suas maneiras particulares de classificar o próprio universo
material, natural e social.
Por exemplo,
a Etnohistória pode ser considerada como
a concepção que os membros de uma determinada cultura desenvolvem e
compartilham sobre os eventos passados, em vez de ser considerada somente a
história de fatos cronológicos dos membros de grupos étnicos.
Em concordância
com esse ponto de vista, a Etnobotânica
pode ser considerada um conjunto de concepções socioculturais específicas,
desenvolvidas pelos membros de grupos culturais distintos, sobre o reino
vegetal, em vez de ser considerada somente uma descrição sobre as plantas e a
sua utilização organizada com base numa taxonomia binominal.
Esse
contexto proporcionou que a Etnociência propusesse uma nova abordagem antropológica
por meio da qual as culturas não eram percebidas somente como uma coleção de
artefatos e um conjunto de normas comportamentais, pois começavam a ser
consideradas como sistemas de conhecimento, que eram revelados por suas
estruturas linguísticas.
Nessa
perspectiva, o conhecimento pode ser considerado um conjunto de habilidades e
competências difundidas ao longo das gerações, que têm por objetivo descobrir
os princípios que regem as normas das culturas organizadas, pois visam
determinar se esses princípios são universais (BROWN, 1999).
Nessa
abordagem, as ciências procuravam focalizar os aspectos ideacionais das
culturas e da natureza, representando uma importante ruptura com as abordagens
materialistas em alguns campos de estudo como a Etnobotânica.
Esse sistema
de Classificação Etnológica refletiu o comportamento humano, a vida social,
os costumes, os produtos materiais e as configurações ecológicas, pois permitiu
classificações múltiplas de objetos individuais por meio de suas formas,
materiais e funções.
Portanto, a Etnociência pode ser considerada um corpo de
conhecimentos que estabelece sistemas de explicação e maneiras diversas do saber e fazer dos membros de grupos
culturais diversos, que foram acumuladas ao longo das gerações, em ambientes
culturais específicos (D'AMBROSIO, 2000).
Nesse
direcionamento, a Etnociência
designa um campo de conhecimento multi, inter e transdisciplinar, que procura
documentar, estudar e valorizar os conhecimentos e as práticas produzidas pelos
membros de grupos culturais distintos, que são transmitidas e difundidas no
decorrer da história.
Esses
conhecimentos e práticas emergem cientificamente de uma fusão de saberes
retroalimentados por meio do discurso multifacetado entre as ciências naturais,
humanas e sociais (MARQUES, 2002).
Entendemos
que a Etnociência está vinculada a
uma questão etimológica, pois o prefixo Etno procede do grego Éthnos, que indica a identidade de
origem e condições socioculturais e inclui a identidade de crenças, valores,
símbolos, mitos, ritos, morais, linguagem, códigos, idéias, procedimentos e
práticas.
A partir
dessa identidade, as vivências e os conceitos de etnia, povo, nação e classe
social foram originadas, concretizadas e definidas, pois o Termo Éthnos está relacionado com os costumes e os hábitos
desenvolvidos pelos membros de um determinado grupo cultural.
Então, a Etnociência auxilia na promoção de uma revisão
lógica, epistemológica e metodológica das ciências conhecidas, visando
documentar, estudar e valorizar o repertório de conhecimentos, fazeres, saberes e práticas
desenvolvidas pelos membros de grupos culturais distintos.
Atualmente,
a Etnociência tem buscado transpor as
abordagens essencialmente classificatórias, pois os pesquisadores e
investigadores têm expressado interesse no estudo das interrelações envolvendo
os membros de grupos culturais em seus próprios ambientes.
Porém, é
necessário estarmos trabalhando na pesquisa de campo para que possamos perceber a Etno-X como uma área de estudo, por meio da adoção
de uma Etnografia de saberes, fazeres, técnicas e
práticas, sem tentar reconhecer nos outros as
disciplinas que só existem na academia (D'OLNE CAMPOS, 2002).
Esse
contexto possibilita que a Etnociência origine uma nova historiografia dos fazeres, saberes, conhecimentos e
práticas científicas, ao considerar a cultura um conjunto de sistemas de crenças,
valores, ideias, procedimentos e práticas desenvolvidas pelos membros de
diferentes grupos culturais.
Finalizando,
o surgimento e o desenvolvimento da Etnociência
contribuíram para questionar e relativizar a racionalidade universalista do
conhecimento ocidental, criando uma abordagem de valorização positiva para o
conhecimento nativo e local.
No entanto,
existe a necessidade de ressaltar que, apesar de suas contribuições, o
adjetivo Etno ainda
mantém uma conotação implícita para se referir ao conhecimento gerado
pelos outros, por exemplo,
os colonizados e os grupos minoritários, cujos conhecimentos são estudados e
validados a partir do conhecimento científico desenvolvido pelas culturas
ocidentais.
Contudo, é
importante entendermos o dinamismo cultural que ocorre entre os sistemas
acadêmicos e locais de conhecimento.
Nessa
dinâmica, os membros de grupos culturais distintos identificam e decodificam o
conhecimento local que foi adquirido de geração em geração, acumulando-o e
transmitindo-o.
Paralelamente,
o contato com o conhecimento acadêmico os auxilia a estabelecer relações e
comparações entre esses dois tipos de conhecimentos (D'AMBROSIO, 1990).
Em concordância
com esse ponto de vista, a comunicação entre
gerações e o encontro de grupos com culturas diferentes criam uma dinâmica
cultural e não podemos pensar numa cultura estática, congelada em tempo e
espaço.
Essa dinâmica é lenta e o que percebemos na exposição mútua de culturas
é uma subordinação cultural, e algumas vezes até mesmo destruição de uma das
culturas em confronto, ou a convivência multicultural (D'AMBROSIO, 2005).
Nesse
contexto, existe uma complementaridade entre as relações de conhecimento
existentes entre os membros de grupos culturais distintos e os pesquisadores e
investigadores das ideias, noções, procedimentos e práticas matemáticas
desenvolvidas localmente.
A
ETNOBIOLOGIA = DINÂMICA DE RELACIONAMENTOS COM O MEIO AMBIENTE
Em 1935, o termo Etnobiologia foi cunhado por Edwar F. Castetter durante a condução de
pesquisas sobre o conhecimento e a utilização do meio ambiente por povos não
ocidentais (CLÉMENT, 1990).
O campo de conhecimento
denominado Etnobiologia surgiu do campo
da Sociolinguística, da Antropologia Cognitiva
e da Etnociência como um campo de
pesquisa multidisciplinar que investiga as diversas percepções culturais da
relação da humanidade com a natureza.
Esse campo
do conhecimento também investiga as maneiras e os modos como essas percepções
são ordenadas e classificadas pelas sociedades por meio da linguagem (BEGOSSI,
1993).
Então, a Etnobiologia pode ser considerada o estudo
científico da dinâmica de relacionamentos entre os membros de grupos culturais
distintos com o meio ambiente no qual estão inseridos.
Nesse
contexto, a Etnobiologia estuda as
conceituações desenvolvidas pelos membros de grupos culturais distintos com
relação à biologia, buscando entender o papel da natureza no sistema de crenças
e de adaptação desses grupos em determinados ambientes socioculturais (POSEY,
1987).
Numa
perspectiva mais ampla, a Etnobiologia
pode ser considerada o estudo das interações entre a humanidade e a biosfera
(CLEMENT, 1990), pois pode ser entendida como estudo das relações entre as
populações humanas e o ambiente e dos fatores que afetam essas relações sob uma
perspectiva adaptativa ou sistêmica.
Por outro
lado, a Etnobiologia oferece um tipo
de relativismo por meio do qual é possível reconhecer outros modelos de
conhecimento sobre a natureza, que podem estar desvinculados do racionalismo e
pragmatismo da ciência vigente (BANDEIRA, 2001).
Essa
abordagem pode revelar as diferentes maneiras pelas quais o conhecimento sobre
o mundo natural está organizado, de acordo com os pressupostos desenvolvidos
pelos membros de diversos grupos culturais.
Nesse
direcionamento, a Etnobiologia
também pode ser considerada a ciência que estuda as conceituações provenientes
do conhecimento adquirido pelos membros desses grupos sobre a percepção que
desenvolveram no decorrer do tempo com relação ao ambiente natural no qual
estão inseridos.
Assim, o
principal objetivo dessa abordagem é entender como a natureza influencia no
desenvolvimento das crenças e na adaptação dos membros de grupos culturais
distintos ao ambiente social, cultural, político e econômico, de acordo com os
próprios aspectos cognitivos.
Essa
abordagem Etnobiológica possibilitou o
desenvolvimento de estudos relacionados com o ambiente natural e com a
investigação de espécies de plantas e animais, que alcançaram significados
social, religioso e simbólico para os membros de um determinado grupo cultural.
Assim, a
interpretação dos dados qualitativos coletados possibilitou a detectação dos
significados dessa relação a partir das percepções pessoais dos membros desse
grupo a respeito das relações biológicas e ecológicas, que foram desenvolvidas
nesse ambiente (ELLEN, 2006).
Por exemplo,
quando os membros de um determinado grupo cultural possuem uma profunda relação
com o meio natural no qual estão inseridos e com as suas plantas e animais,
podemos concluir que esses membros desenvolveram um alto grau de conhecimento Etnobiológico,
que pode servir como uma base para a estruturação de modelos sustentáveis de
trabalho coletivo, que tem como objetivo favorecer a manutenção do
desenvolvimento sustentável desse meio ambiente.
Diante desse
contexto, a Etnobiologia estuda como os membros pertencentes a
qualquer tradição cultural interpretam, utilizam e gerenciam os seus
conhecimentos sobre os domínios da própria experiência ambiental (ELLEN, 2006),
de acordo com o sistema de crenças e adaptações desenvolvidos no decorrer das
gerações.
Concordamos
com Adams (2000) ao argumentar que a Etnobiologia
valoriza e cataloga o saber e
o fazer acumulados pelos
membros de grupos culturais distintos, fornecendo argumentos importantes para a
preservação dessas culturas e de seus habitats, pois tem como objetivo auxiliar
na elaboração de políticas sociais e ambientais ecologicamente justas.
A
ETNOECOLOGIA = CAMPO DE CONHECIMENTO TRANSDISCIPLINAR
Em 1954, o termo Etnoecologia foi
utilizado pela primeira vez na literatura científica por Harold
Conklin para estudar o
relacionamento entre os membros de um determinado grupo cultural com o seu meio
natural, incluindo as plantas, os animais, os tipos de solo e as águas;
buscando o equilíbrio essencial para essa convivência.
O estudo
conduzido por Conklin (1954) enfatizou o reconhecimento da influência do
ambiente natural na relação existente entre os membros de grupos culturais
distintos e o meio ambiente.
Os
resultados desse estudo contribuíram para uma mudança no foco investigativo das
pesquisas, direcionando-o a partir daí para o entendimento dessa relação de
acordo com o ponto de vista dos nativos e das comunidades locais (NAZAREA,
1999, HANAZAKI, 2006).
Originou-se,
assim, uma ampliação da Etnoecologia que, de uma perspectiva meramente cognitiva,
que predominava na época, passou a reconhecer a influência dos aspectos
históricos e políticos no desenvolvimento do conhecimento, dos procedimentos e
das práticas presentes nos ambientes natural, social e cultural (NAZAREA,
1999).
A partir dos
resultados obtidos no estudo conduzido por Conklin (1954), o prefixo Etno começou a ser utilizado com
dois significados - o primeiro referia-se ao estudo da ecologia desenvolvida
pelos membros de um grupo cultural específico; o segundo referia-se às
percepções dos membros desse grupo sobre os fenômenos a serem estudados no
ambiente natural (FOWLER, 2000, HANAZAKI, 2006).
Como os
conhecimentos desenvolvidos pela humanidade não se enquadram em categorias e
segmentações precisamente definidas como a biologia e a matemática, que tentam
organizar o conhecimento de uma maneira artificial (POSEY, 1987), a Etnoecologia busca preencher essa lacuna,
propondo o desenvolvimento de um estudo compreensivo sobre a interrelação
existente entre os ambientes natural, cultural e social com os membros de
grupos culturais distintos.
Numa
abordagem mais ampla, a Etnoecologia
refere-se a um campo científico e transdisciplinar da pesquisa que estuda os
pensamentos, os conhecimentos, as crenças, os sentimentos e os comportamentos
que mediam as interações existentes entre os membros de grupos culturais
distintos que os desenvolveram ao longo das gerações, no decorrer da história.
Essa
abordagem também inclui todos os elementos que compõem um determinado Ecossistema,
bem como a influência e o impacto decorrentes do dinamismo cultural,
provenientes dos encontros e interações realizadas nos ambientes (MARQUES,
2002) natural, social e cultural.
Nesse
enfoque transdisciplinar, a Etnoecologia
explora como a natureza é percebida pelos membros desses grupos por meio da
valorização de suas crenças e conhecimentos, que tem por objetivo a utilização
sustentável de seus recursos naturais (TOLEDO, 2002).
Assim, a Etnoecologia também se refere ao estudo e
investigações de como os membros de grupos culturais distintos organizam e
classificam o conhecimento que adquiriram sobre os ambientes natural, social e
cultural nos quais estão inseridos.
Por outro
lado, a Etnoecologia é um campo de
conhecimento importante para auxiliar no esclarecimento e reconhecimento das
maneiras pelas quais os membros de grupos culturais distintos conceituam os
ecossistemas dos quais são dependentes para a própria sobrevivência.
Essa
abordagem contribui para que possamos compreender como os membros desses grupos
interagem com o meio-ambiente, bem como para entender como esses membros se
relacionam com os recursos naturais existentes nesse ambiente (BARLETT, 1980).
A
ETNOMATEMÁTICA E OS ASPECTOS CULTURAIS DA MATEMÁTICA
Desde o
princípio da humanidade, os membros de cada grupo cultural têm desenvolvido
ideias e práticas matemáticas, sendo que algumas noções e procedimentos
originaram-se na antiguidade, desenvolveram-se no Egito e na Mesopotâmia e
rapidamente espalharam-se pela Europa.
No entanto,
outras regiões do mundo também desenvolveram procedimentos e práticas
matemáticas significantes.
As
manifestações matemáticas desenvolvidas em regiões como a China, o sul da
Índia, a Mesoamérica, bem como em algumas regiões da África e da América do Sul
foram úteis para os membros que pertenciam aos grupos culturais distintos que
viviam naquelas regiões.
Porém, por
causa do colonialismo e isolamento de algumas dessas regiões, o conhecimento
matemático produzido e acumulado pelos membros desses grupos culturais não
influenciou o conhecimento matemático acadêmico e científico produzido na
contemporaneidade (OREY; ROSA, 2005).
Nessa perspectiva, para
"alguns estudiosos, pesquisadores e investigadores, a falha em reconhecer
o sucesso da matemática das culturas não ocidentais deve-se não somente à
ignorância, mas também à conspiração, pois as raízes da civilização europeia
são Afro-Asiáticas" (TERESI, 2002,).
Assim, o Programa Etnomatemática surgiu para confrontar os tabus de que a matemática é um campo
de estudo universal, acultural e desvinculado das tradições.
Apesar de
reconhecermos que, no decorrer da história, vários precursores contribuíram
para o desenvolvimento do pensamento matemático e colaboraram para a
compreensão dessa área do conhecimento, foi somente em
1977 que o Termo
Etnomatemática foi introduzido por Ubiratan D'Ambrosio
numa palestra proferida no Annual
Meeting of the American Association for the Advancement of Science, em
Denver, nos Estados Unidos.
A
consolidação desse termo culminou, em 1984,
com a palestra de abertura do ICME5, intitulada Sociocultural Bases
of Mathematics Education proferida por D'Ambrosio, na Austrália,
que instituiu oficialmente o Programa Etnomatemática como um campo de pesquisa
(ROSA; OREY, 2005).
Em 1985, D'Ambrosio escreveu o Artigo intitulado Etnomatemática e seu lugar na História e Pedagogia da Matemática , de essencial importancia Pará o Reconhecimento desse campo de Pesquisa, pois "repre O Primeiro TRATADO compreensivo e teórico, em Língua Inglesa, faça Programa Etnomatemática "(POWELL; FRANKENSTEIN, 1997).
Nesse
contexto, existe a necessidade de salientarmos a importância de Ubiratan
D'Ambrosio para o desenvolvimento do Programa Etnomatemática, pois é o mais
importante teórico e filósofo nesse campo de estudo.
D'Ambrósio também é o líder internacional e o
disseminador mundial das ideias que envolvem a Etnomatemática e suas aplicações
em Educação Matemática (ROSA; OREY, 2005).
Em seus estudos, na área sociopolítica, D'Ambrosio
(2004) estabeleceu um relacionamento amplo entre a matemática, a antropologia e
a sociedade.
Num acordo
firmado em 1997, D'Ambrosio foi considerado o Pai Intelectual do Programa
Etnomatemática (POWEL; FRANKENSTEIN, 1997).
Nos estudos realizados por Shirley (2000),
D'Ambrosio foi eleito um dos mais importantes matemáticos do século XX, nos
assuntos relacionados à sociedade, à política e à Etnomatemática.
Em 1990,
D'Ambrosio define o Programa Etnomatemática como o estudo das ideias e práticas matemáticas que foram
desenvolvidas pelos membros de culturas específicas no decorrer da história.
Esse
programa estuda e investiga os procedimentos e as técnicas matemáticas que são
apropriadas para a resolução de situações-problema enfrentadas em cada contexto
cultural, que auxiliam os membros desses grupos a lidar com o ambiente
sociocultural, por meio do trabalho desenvolvido com as medidas, os cálculos,
as inferências, as comparações, as classificações e a modelagem.
Os membros
dessas culturas desenvolveram a habilidade de modelar o meio natural e social,
de acordo com as suas próprias necessidades, para explicar e entender os
fenômenos que ocorrem nesses ambientes.
Então, a Etnomatemática pode
ser considerada um domínio de investigação científica que reflete a consciência
sobre a existência de muitas matemáticas, específicas para os membros de
determinados grupos culturais.
Assim, a Etnomatemática está situada numa área de
transição entre a antropologia cultural e a matemática academicamente
institucionalizada, tendo como suporte teórico a matemática antropológica.
Em
concordância com esse contexto, o Programa
Etnomatemática pode ser
considerado a arte ou técnica de explicar, conhecer, entender e compreender o
desenvolvimento do pensamento matemático em diversos contextos culturais
(D'AMBROSIO, 1990).
Assim, esse programa pode ser considerado uma Etnociência que estuda os
fenômenos científicos e tecnológicos, tendo relação direta com o background cultural, econômico,
político, ambiental e social dos membros de grupos culturais distintos
(D'AMBROSIO, 1993).
O Programa
Etnomatemática pode ser
caracterizado como o conhecimento matemático incorporado na cultura de um
determinado povo.
Em outras
palavras, a Etnomatemática é parte
integrante da Etnologia, pois é uma Etnociência que possui determinados métodos
para atingir os conceitos proporcionados pelas ciências institucionalizadas
(D'AMBROSIO, 1990).
Por outro
lado, o objeto de estudo da Etnomatemática
é bastante abrangente, pois se confunde com o estudo dos processos para
analisar a geração, organização, transmissão, difusão e institucionalização do
conhecimento matemático em diversos sistemas culturais.
Assim, as
pesquisas em Etnomatemática estiveram,
desde a sua origem, envolvidas com as relações entre o conhecimento matemático
e a cultura, pois os membros de diversos grupos culturais devem ser
reconhecidos como possuidores de conhecimentos matemáticos e científicos.
Esses
conhecimentos são desenvolvidos no próprio universo cultural desses membros,
sendo eficientes na resolução de situações -problema e fenômenos enfrentados no
cotidiano.
A
contextualização da matemática é essencial para qualquer programa educacional.
Por exemplo,
não é possível desvincular Os Elementos de Euclides do
panorama cultural da Grécia na antiguidade ou o desenvolvimento da numeração
indo-arábica do florescimento do mercantilismo europeu nos séculos XIV e XV
(D'AMBROSIO, 1993).
Assim, a
matemática se contextualiza como um campo do conhecimento utilizado para
solucionar situações-problema que, tendo se originado em outro contexto cultural,
exigem a utilização dos instrumentos intelectuais que foram desenvolvidos nessa
cultura.
Então, o
domínio dessas duas Etnomatemática oferece mais possibilidades de explicações,
entendimentos e manejo de situações inovadoras de resolução de problemas, bem
como a compreensão dos fenômenos que surgem no cotidiano.
Dessa
maneira, o acesso a um maior número de instrumentos e técnicas intelectuais,
devidamente contextualizadas, propicia uma capacidade inovadora para a
resolução de novos problemas e também para o enfrentamento de situações novas.
Então, um
dos principais objetivos do Programa
Etnomatemática é modelar
adequadamente um determinado fenômeno para que, com esses instrumentos,
possamos chegar a uma possível solução ou a um curso de ação para a resolução
da situação-problema a ser enfrentada no cotidiano (ROSA, 2000).
Essa
abordagem facilita a aprendizagem, pois desenvolve a capacidade crítica e
reflexiva de explicar, compreender e enfrentar situações-problemas que afligem
a sociedade contemporânea.
Assim, a
"Proposta Pedagógica da Etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando com
situações reais no tempo, agora e no espaço, aqui" (D'AMBROSIO, 2001).
Em outras
palavras, um dos principais objetivos desse programa é questionar criticamente
a resolução dos fenômenos que afligem a sociedade contemporânea, pois, por meio
dessa abordagem, podemos mergulhar nas raízes culturais dos membros desses
grupos e praticarmos a dinâmica cultural (D'AMBROSIO, 2001).
INTERLOCUÇÕES
POLISSÊMICAS DA ETNOMATEMÁTICA COM A ETNOCIÊNCIA
A ciência
pode ser entendida como uma maneira de explicar, entender, compreender e lidar
com o ambiente natural, pois os membros dos grupos culturais aprenderam a
produzir conhecimento científico para lidar com os fenômenos que ocorrem nesse
ambiente.
Esse corpo
de conhecimento denominado Etnociência é produzido num determinado contexto por meio
de motivações específicas, modificado e alterado no decorrer da história, como
resultado de sua exposição aos membros de outros grupos culturais (D'AMBROSIO,
2000).
Historicamente,
a humanidade foi exposta a diferentes maneiras de conhecimento científico, que
foram produzidas, acumuladas e difundidas em contextos culturais distintos.
O resultado
dos encontros entre os pesquisadores, investigadores e os membros de grupos
culturais distintos facilitou a interação entre esses indivíduos cujo objetivo
foi o compartilhamento das experiências vivenciadas e experienciadas nos
ambientes social, cultural, político, econômico e natural; promovendo o
dinamismo cultural (D'AMBROSIO, 1990).
Então, a Etnociência evoluiu
para facilitar o entendimento e a compreensão das necessidades diárias dos
membros desses grupos.
Contudo,
para que esses encontros sejam conduzidos adequadamente, é necessário que os
pesquisadores e investigadores entendam e compreendam os membros desses grupos
por meio do desenvolvimento de uma relação cíclica que pode ocorrer com a
realização de encontros dialógicos.
Nesses
encontros podem ocorrer constantes transformações nas leituras de mundo desses
indivíduos, que estão relacionadas com o fato de se estar trabalhando no campo
ou na academia.
O
entendimento desse movimento indissociável de ir e vir entre o campo e a academia facilita o
estabelecimento de relações simétricas na interação dialógica que permeia o
encontro entre esses indivíduos.
Por outro
lado, a Etnociência pode ser
considerada um corpo de conhecimentos estabelecido como um sistema composto por
explicações e "distintas maneiras de fazer práticas e de saber teorias,
que caracterizam uma cultura" (D'AMBROSIO, 2001).
Dentre esses
sistemas, o corpo de conhecimentos derivado de práticas qualitativas e
quantitativas como contar, pesar, medir, sortear, inferir, classificar e
modelar é muito importante para o desenvolvimento do Programa Etnomatemática.
De acordo
com esse contexto, esses campos de estudo possuem uma relação simbiótica, pois
são programas de pesquisa relacionados com a historiografia e a epistemologia,
podendo ser considerados corpos de conhecimento e práticas pedagógicas que
refletem a dinâmica cultural dos encontros que ocorrem entre os membros de
grupos culturais distintos no decorrer da história (D'AMBROSIO, 2000).
Nesse direcionamento,
entendemos que a Etnociência pode ser
considerada um campo de estudo multidisciplinar que investiga o papel dos
sistemas de conhecimento na construção da realidade por meio do relacionamento
da humanidade com o seu meio-ambiente, pois focaliza o conhecimento produzido
pelos outros.
Assim, o
conceito de Etnociência influenciou o
desenvolvimento do Programa
Etnomatemática, pois forneceu ferramentas teóricas para a
compreensão do interrelacionamento do conhecimento matemático com os distintos
contextos culturais.
No entanto,
historicamente, é necessário enfatizar que, apesar dessa influência, o Programa Etnomatemática evoluiu de maneira independente, pois se desenvolveu no campo
da Educação Matemática, enquanto a Etnociência manteve um estreito relacionamento com os
campos das ciências naturais.
Contudo,
entendemos que a Etnomatemática
possui características que ampliam os objetivos da Etnociência,
pois tem como foco o estudo das ideias, noções, procedimentos e práticas
matemáticas produzidas e desenvolvidas na organização diária dos membros de
grupos culturais distintos (D'AMBROSIO, 1993).
Por outro
lado, as implicações pedagógicas desses dois programas se relacionam com os
fatores que influenciam, formatam e modelam o pensamento da humanidade,
direcionando-o para a geração, organização intelectual e social, bem como para
a difusão do conhecimento.
A Etnociência e a Etnomatemática
são programas educacionais e de pesquisa, tipicamente interdisciplinares, que inter-relacionam
os resultados provenientes da cognição, epistemologia, história e da educação.
Então, as
ciências e a matemática podem ser consideradas construtos intelectuais que a
humanidade desenvolve em resposta às necessidades cotidianas, para enfrentar os
desafios e os fenômenos que ocorrem nos ambientes social, cultural, econômico,
político e natural nos quais estão inseridos (ROSA; OREY, 2006).
Nesse
contexto, a Etnociência é um corpo de
conhecimento estabelecido como um sistema de explicações, maneiras e modos
de fazer que foram
desenvolvidos pelos membros de um determinado grupo cultural.
Essas
maneiras e modos foram acumulados e difundidos de geração em geração no
decorrer da história, em distintos ambientes - social, natural e cultural.
Em nosso
ponto de vista, essa abordagem não difere dos conceitos científicos e tecnológicos
atuais, com exceção da ênfase dada no reconhecimento da especificidade que
resulta da influência dos ambientes social, natural e cultural na produção do
conhecimento matemático.
Nessa
perspectiva, a Etnomatemática pode ser
considerada um corpo de conhecimento derivado das práticas matemáticas
quantitativas e qualitativas desenvolvidas pelos membros de grupos culturais
distintos nesses ambientes, como a contagem, a pesagem, a medição, a triagem e
a classificação.
INTERLOCUÇÕES
POLISSÊMICAS DA ETNOMATEMÁTICA COM OUTROS CAMPOS DE CONHECIMENTO
O caráter
teórico das ciências, que busca explicar e compreender as estruturas e os modos
da vida social e cultural, tem como objetivo a sua aproximação com o caráter
teórico-prático da Etnociência.
O principal
objetivo dessa abordagem procura reconhecer e promover as diferentes maneiras
do saber-fazer desenvolvidos
em diferentes culturas.
Como a Etnociência possui um caráter de pesquisa
científica que reconhece e valoriza a diversidade cultural humana, os campos de
investigação Etnocientíficos como a Etnobiologia e a Etnoecologia
possuem interseções com a Etnomatemática,
pois estudam as práticas cotidianas para promover o seu reconhecimento, bem
como a sua valorização e preservação.
Então, a
articulação entre a antropologia, a teoria, a prática e o interesse pela
diversidade cultural e a aceitação de uma perspectiva epistemológica inovadora
permite a investigação do objeto de estudo a partir do olhar dos membros de grupos culturais distintos.
Nesse
direcionamento, os estudos relacionados com a Etnomatemática,
a Etnobiologia e a Etnobotânica também estão relacionados com os aspectos
antropológicos, sociais e culturais desenvolvidos pelos membros desses grupos.
Por exemplo,
um dos principais objetivos da Etnobiologia,
bem como o da Etnoecologia está relacionado com a promoção de um
embasamento teórico capaz de integrar diferentes ramos das ciências naturais e
sociais com outros sistemas científicos (RIBEIRO, 1986).
Filosoficamente,
esses objetivos servem como um elo entre os membros de diferentes grupos
culturais na intenção de esclarecer a compreensão e o respeito mútuo entre os
membros desses grupos.
Corroborando
com essa perspectiva, a Etnomatemática visa estimular reflexões mais abrangentes
acerca da natureza do conhecimento matemático nos âmbitos cognitivo, histórico,
social e cultural.
Então, essa
abordagem objetiva compreender o saber-fazer como
conhecimento construído pela humanidade no decorrer da história, em diferentes
contextos culturais (D'AMBROSIO, 2001).
Entendemos
que esses princípios também estão inseridos na proposta filosófica da Etnobiologia, da Etnoecologia,
bem como em outros campos de conhecimento Etno-X.
Dessa maneira,
a definição dos termos Etnobiologia
e Etnoecologia segue o mesmo princípio
daqueles que originaram outros campos da Etnologia
como a Etnomatemática, que é um
programa que estuda o pensamento matemático desenvolvido no próprio contexto
cultural.
Esse
contexto permite o entendimento de que a Etnobiologia,
a Etnoecologia e a Etnomatemática
são campos de conhecimento concebidos a partir do ponto de vista de como os
membros de um determinado grupo cultural atuam em seu próprio contexto natural.
Essa
abordagem permite o estudo compreensivo das relações desses membros com os
ambientes social, cultural, econômico, político e natural.
Um aspecto
importante da Etnobiologia, Etnoecologia e Etnomatemática como Etnociência inclusivas é a preocupação constante em
descrever e apresentar o conhecimento acumulado pelos membros de grupos
culturais distintos por meio do ponto de vista cultural.
Nessa
abordagem, é importante que os pesquisadores, investigadores e Etnógrafos cataloguem os conhecimentos
desenvolvidos nos grupos culturais, descrevendo-os da maneira como os membros
desses grupos os entendem, compreendem e interpretam, pois devem estar em
concordância com as categorias elaboradas pela Etnociência
desenvolvida em cada uma dessas culturas.
Por exemplo, as comunidades locais como os
indígenas, ribeirinhos e pescadores artesanais sabem onde encontrar os peixes,
pois conhecem o comportamento dos cardumes de algumas espécies, o período de
migração e os locais onde os peixes procuram por alimentos e se protegem dos
predadores.
Essas comunidades acumularam informações sobre a
localização desses recursos e sobre a sua disponibilidade, sendo capazes de
elaborar planejamento e divisão de trabalhos para evitar a exploração desordenada
e indevida dos recursos do ambiente natural no qual estão inseridos.
Assim, essas comunidades elaboram planos e projetos
de gestão para proteger os recursos naturais disponíveis nesse ambiente.
Essas informações podem ser aproveitadas
cientificamente para estabelecer projetos de manejo e conservação do
meio-ambiente, pois o conjunto das informações oriundas pelo conhecimento e
saber popular, transmitidos por gerações, permite que essas comunidades de
pescadores elaborem ações de monitoramento efetivas para impedir a escassez
desses recursos.
Então, o conhecimento e o saber popular também
podem indicar futuras fontes de pesquisa, revelando as relações existentes
entre a natureza, a cultura e o ambiente, que são desconhecidas.
Essas comunidades podem colaborar com o
fornecimento de informações para auxiliar na elaboração de inventários de
espécies, listando os nomes populares das espécies que ocorrem numa determinada
região.
Outras informações também podem ser agregadas ao
estudo como a utilização dos peixes na medicina caseira, a dieta e o habitat
das espécies de peixes, bem como a quantidade que deve ser pescada para evitar
a extinção das espécies que habitam os rios e lagos do ambiente natural no qual
essas comunidades se inter-relacionam.
Em nosso ponto de vista, essa situação exemplifica
uma aproximação entre a Etnobiologia,
a Etnoecologia e a Etnomatemática por meio
da utilização do método científico para pesquisar o conhecimento dos membros
dessas comunidades, que é adquirido por meio de informações que são verificadas
com as observações realizadas no próprio ambiente natural.
A conexão
entre o conhecimento acadêmico e local pode ser fortalecido por uma teoria do
conhecimento apoiada pela dinâmica cultural, que ocorre quando os membros de
grupos culturais distintos se encontram, produzem, geram, organizam, difundem e
institucionalizam o conhecimento (ROSA; OREY, 2007).
As práticas
acadêmicas também podem ser consideradas modos de pensamentos
Etnomatemáticos definidos pelo background cultural e pelos
padrões dos membros de grupos culturais distintos e as instituições que as
praticam, traduzindo esse conhecimento por meio de uma linguagem acadêmica para
incorporá-lo como práticas no próprio cotidiano.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Existe a necessidade de
legitimar, sistematizar, formalizar e valorizar os saberes tradicionais para
que esses conhecimentos transitem do local para o alcance global das
ideias, noções, procedimentos e práticas desenvolvidas localmente e vice-versa.
Nesse
contexto, o conhecimento local tem como foco o estudo dos aspectos
socioculturais dos fenômenos que ocorrem num contexto cultural específico,
visando entendê-los como os membros desses grupos culturais os entendem
(GUDYKUNST, 1997).
Por outro
lado, o conhecimento global focaliza o estudo dos saberes e fazeres que podem
ser generalizáveis entre os membros de grupos culturais distintos, pois são
considerados fenômenos universais (GOLDMAN, 1988).
Nesse
direcionamento, os sistemas de conhecimento local e global podem ser percebidos
como processos inter-relacionados no contexto da diversidade cultural, que
procura revitalizar e valorizar a identidade sociocultural dos membros de
grupos culturais locais (GIDDENS, 2000).
Assim,
propusemos a discussão de um cenário contemporâneo de reflexão para alguns aspectos
de aproximação entre a Etnobotânica, a Etnoecologia,
a Etnociência e a Etnomatemática, que, apesar de serem campos de
conhecimento distintos, demonstram a possibilidade de interação acadêmica.
Nesse
contexto, entendemos que a "Etnomatemática
deva exercitar uma interlocução mais ativa com outras áreas Etno-X, a fim de
fertilizar sua prática científica e pedagógica" (COSTA, 2012).
Dessa
maneira, por causa do desenvolvimento de objetos e assuntos híbridos integrando a cultura e
o conhecimento, esses quatro campos de estudo envolvem um conjunto de relações
que não pode ser reduzido ao recorte instituído pelas disciplinas.
É importante
compreender a inter-relação entre os saberes e fazeres local
e acadêmico, para que possamos compreender a relação existente entre os
conhecimentos desenvolvidos pelos membros de um determinado grupo cultural, pois
as "distintas maneiras de fazer (práticas) e de saber (teorias), que
caracterizam uma cultura, são parte do seu conhecimento compartilhado" (D'AMBROSIO, 2001).
Entendemos
que o Conhecimento Matemático pode ser considerado um conjunto de saberes e fazeres acumulados pelos membros
desses grupos, que é composto por ideias matemáticas como comparar,
classificar, quantificar, medir, explicar, generalizar, modelar e avaliar,
indissociáveis e que estão em permanente evolução.
Então,
procuramos discutir por meio de um enfoque teórico o inter-relacionamento entre
esses conhecimentos, colocando em questionamento a manutenção de suas
fronteiras disciplinares para que possamos nos direcionar para uma abordagem
mais ampla da relação existente entre os membros de grupos culturais distintos
com os ambientes social, cultural, econômico, político, natural nos quais estão
inseridos.
Esse
contexto possibilitou o desenvolvimento de uma abordagem Etnometodológica
para mostrar a inter-relação dos membros de grupos culturais distintos com
contextos diversos, por exemplo, o ambiental, o social e o cultural por meio do
apontamento de novos aportes para a compreensão das relações socioculturais.
Dessa
maneira, é importante que mobilizemos o conceito de dinamismo cultural, pois é
uma "dinâmica de interação que está sempre presente no encontro de
indivíduos que faz com que não se possa falar com precisão em culturas, finais
ou estanques.
Culturas
estão em incessante transformação, obedecendo ao que podemos chamar de dinâmica
cultural" (D'AMBROSIO, 2001).
Então, esse
dinamismo pode ser percebido como um estudo teórico e metodológico das maneiras
pelas quais ocorrem o interrelacionamento e a interação entre os membros de grupos
culturais distintos por meio da troca de ideias, técnicas, explicações e
interpretações de fenômenos cotidianos que ocorrem em contextos diversos,
tendo, como consequência, a geração de novos procedimentos e práticas
resultantes desses encontros culturais.
Assim, como
o conhecimento não se enquadra em categorias e segmentações (POSEY, 1987),
existe a necessidade de compreendê-lo holisticamente, por meio da inter-relação
entre os membros de grupos culturais distintos com os ambientes natural,
cultural, político e social.
Nesse
direcionamento, a partir de um viés sociocultural imbricado na perspectiva
antropológica e direcionado para a compreensão do conhecimento localmente
desenvolvido, a Etnoecologia, a Etnobiologia, a Etnociência
e a Etnomatemática têm por
desafio diminuir os distanciamentos epistemológicos entre as ciências humanas,
exatas e naturais.
Nessa
abordagem, é necessário dissolver as fronteiras existentes entre esses campos
de estudo, por meio do reconhecimento de sistemas alternativos de conhecimento.
Por exemplo,
os estudos conduzidos por D'Ambrosio (1990),
Villoro (1998), Olivé (1999), Arias-Schreiber (2001), Eglash, (2006), Rosa e Orey (2010)
têm abordado os sistemas de conhecimentos locais por meio da reflexão
epistemológica, das questões sociais e culturais e das problemáticas jurídicas
e ambientais.
Os membros
dos grupos culturais distintos atuam como atores sociais, favorecendo o valor
da diversidade social e da pluralidade cultural (CUETO, 1995) dos ambientes
social, político, econômico e natural nos quais estão inseridos.
Dessa
maneira, no intuito de simetrizar a relação que compreende os pesquisadores,
investigadores e os outros,
é necessário destacar a importância de uma postura científica capaz de dialogar
com o conhecimento local sem a imposição de categorias acadêmicas (POSEY,
1987).
Em nosso
ponto de vista, este artigo procurou estabelecer relações entre campos de conhecimento Etno-X, por
exemplo, a Etnobiologia, a Etnoecologia e Etnociência
com a Etnomatemática.
O
estabelecimento dessas relações baseou-se no fato de que os membros de cada grupo
cultural constroem a sua Etnociência
durante o desenvolvimento de ferramentas e instrumentos necessários para
possibilitar o processo de leitura do próprio mundo.
Esse
processo possibilita a construção do conhecimento para que os membros desses
grupos possam entender, compreender e explicar, por meio de leituras distintas,
os fenômenos e as situações-problema que enfrentam no cotidiano.
Por exemplo,
a "Etnolinguística tenta estudar a linguagem nas suas relações com o
todo da vida social e cultural" (FAVROD, 1977).
Assim, quando
estabelecemos uma relação da Etnolinguística
com a Etnomatemática, obtemos que
a "Etnomatemática tenta estudar
a matemática (ou ideias matemáticas) nas suas relações com o todo da vida
social e cultural" (GERDES, 1996).
De acordo
com esse contexto, desde o seu lançamento no final
da década de 1970, o Programa
Etnomatemática foi conceituado
por D'Ambrosio (1990) num sentido amplo, que se aproxima da própria noção de Etnociência, podendo ser considerada de uma
maneira abstrata como um conjunto de Etno-X.
Com relação
à Etnomatemática, é importante ressaltar
que D'Olne Campos (2002) afirma que "por argumentos etimológicos,
D'Ambrosio procura uma definição geral do termo e quase a identifica com uma Etnociência".
Nesse
direcionamento, a Etnomatemática pode ser definida como uma "Etnociência que estuda os fenômenos
científicos e, por extensão, tecnológicos, em relação direta com o seu
background social, econômico e cultural" (D'AMBROSIO, 1987).
Argumentamos,
portanto, que existe uma interface dialógica significativa entre a Etnomatemática, a Etnociência e os demais campos de conhecimento Etno-X, que deve originar reflexões
interdisciplinares interessantes como consequência de maneiras transdisciplinares
de ler o mundo.
Finalizando, existe a
necessidade de promover uma sinergia entre os conhecimentos desenvolvidos
localmente com aqueles desenvolvidos na academia para que, por meio desse
dinamismo cultural, os conhecimentos locais possam interagir com os
conhecimentos consolidados na academia, desenvolvendo uma relação dialógica
entre esses saberes e fazeres.
Assim, procuramos
mostrar, com esse estudo teórico, que podemos avançar na possibilidade de uma
abordagem polissêmica entre campos de conhecimento distintos, o que envolve o
rompimento de algumas fronteiras disciplinares e epistemológicas.
ETNOFARMACOLOGIA - Resumo – III
A Etnofarmacologia é uma disciplina recente no meio acadêmico.
Embora o termo Etnofarmacologia tenha aparecido pela primeira vez
durante o evento realizado em 1967, “Ethnopharmacological search
for new psychoactive drugs”, a “idéia” dessa
disciplina já havia sido apresentada em 1924
por Louis Lewin na sua obra intitulada PHANTASTICA.
Louis Lewin (1850-1929)
nasceu em Tuchel, na Prússia Ocidental.
Ele
passou a maior parte de sua vida morando em Berlim, onde ele se formou na
Universidade de Berlim, em 1875, como um médico, especializado em Farmacologia e
era um especialista no campo da toxicologia.
Conhecido
por seu estilo extraordinário de palestras, que realizou "o público
encantado", ele também tinha um conhecimento amplo de história, geografia
e antropologia.
Com 248
principais publicações entre (1874-1929,) Lewin foi
um acadêmico líder de seu tempo, mas foi o seu interesse pelos efeitos
colaterais de certos medicamentos que ele é lembrado.
Originalmente, a Etnofarmacologia
era definida como uma ciência que procurava entender o universo dos recursos
naturais (plantas, animais e minerais) utilizados como drogas sob a ótica de
grupos humanos.
No entanto, ao longo do tempo esta disciplina
evoluiu, sendo definida por Bruhn & Holmsted (1981) como: “Exploração científica
interdisciplinar de agentes biologicamente ativos, tradicionalmente empregados
ou observados pelo homem”.
Os Estudos
Etnofarmacológicos podem ter
várias aplicações, entre elas:
Valorização
da diversidade cultural;
Resgate e
valorização do conhecimento tradicional a respeito da utilização medicinal dos
recursos naturais;
Entendimento
sobre as dinâmicas do conhecimento tradicional;
Desenvolvimento
científico e tecnológico de medicamentos.
Um dos critérios utilizados pelos laboratórios
farmacêuticos, universidades na seleção de recursos naturais visando o
desenvolvimento de novas drogas é a utilização de dados de levantamentos
Etnofarmacológicos, sobretudo aqueles realizados em países
tropicais, por apresentarem altas taxas de biodiversidade e endemismo.
Alguns levantamentos Etnofarmacológicos
têm sido realizados nos diversos biomas brasileiros, podendo ser utilizados no
desenvolvimento de novas drogas.
Farmacognosia
DROGAS
Deriva do termo grego phárn,
que tanto pode significar veneno como remédio.
Na terminologia farmacêutica Fármaco designa uma
substância química conhecida e de estrutura
química definida dotada de propriedade farmacológica.
Em termos correntes, a palavra Fármaco
designa todas as substâncias utilizadas em Farmácia e com ação
farmacológica, ou pelo menos com interesse médico.
Por convenção, substâncias inertes (como excipientes) não são
considerados fármacos.
De acordo com esta definição, Fármaco designa qualquer composto químico que seja utilizada com fim medicinal, o
que torna a sua distinção de medicamento bastante sutil.
Há uma grande confusão, portanto, sobre o uso de droga e Fármaco.
Isso porque nos artigos científicos escritos em Inglês, o uso do termo
"drug" está sendo usado na função de fármaco.
E essa mesma palavra "drug" pode ser ainda utilizada
como drogas ilícitas como: haxixe, maconha, entre outras.
Assim, nas últimas décadas droga adquiriu
a conotação de substância ilícitas de abuso.
E Fármaco para
designar, num sentido lato, qualquer substância com atividade endógena
ou farmacológica pode ser definido como uma substância química que
interage com uma parte do corpo para alterar um processo fisiológico ou
bioquímico existente.
Pode diminuir ou aumentar a função de um órgão, tecido ou célula, mas
não pode criar novas funções para eles.
HISTÓRICO :
Anteriormente, a extração de Fármacos
era realizado somente através de materiais vegetais ou minerais, sem
conhecimento da causa da doença ou de que forma essas substâncias utilizadas
faziam seu efeito de cura.
Paracelso adotou
a teoria da Doutrina
da Assinatura, que dizia que Deus formulava a cura de uma
doença indicando um sinal comparativo.
Paracelsus - (1493 - 1541)
Por exemplo, era o formato da flor de verônica um olho, então a verônica
funcionava no combate de tratamento de doenças oculares.
Depois do século XIX, iniciou-se a substituição dos Fármacos Naturais pelos sintéticos, descobertas ao acaso, triagem
empírica, modificação molecular, introdução de grupos volumosos, alteração de
estado eletrônico, entre outros.
CLASSIFICAÇÃO DOS FÁRMACOS
QUANTO A ORIGEM
1. Natural
· BIOSÍNTESE→ O Fármaco é originado a partir da ingestão e absorção do farmaco para o tecido alvo. Com variações de tecido para tecido.
· BIOTRANSFORMAÇÃO→ O Fármaco é "finalizado" por um ser vivo ou parte dele. Ex: Anticoncepcional.
· BIOLOGIA MOLECULAR→ Um organismo recebe informação genética que não possuía e com ela nos dá o fármaco.
2. animal
3. Planta
4. Artificial
·
SÍNTESE→ O Fármaco é construído pelo homem a partir de pequenas estruturas e com
metodologias mais pesadas (altas temperaturas)
· SEMI-SÍNTESE→ É semelhante à biotransformação, o homem apenas finaliza em poucas etapas uma
molécula de certa complexidade e origem natural.
QUANTO AO FOCO DE AÇÃO
- ORGANOTRÓPICOS – Condicionam a alteração de um parâmetro biológico (EX.:anti-hipertensores)
- ETIOTRÓPICOS – Não influenciam qualquer atividade biológica. Finalidade é matar ou impedir multiplicação de microrganismos patogénicos.
QUANTO A OCASIÃO DE USO
·
PREVENTIVO - Vacinas
e anticoncepcionais.
·
SUBSTITUTIVO - Vitaminas,
insulina.
· usados para suprimir a causa da Doença - bactericida, bacteriostáticos.helio
· SINTOMÁTICO - Corrigem
os sintomas sem eliminar a causa, como ocorre nos analgésicos.
EFEITOS QUE RESULTAM DA AÇÃO
DOS FÁRMACOS
· EFEITO TERAPÊUTICO – Ação
terapêutica (uma ou mais)
· EFEITOS SECUNDÁRIOS – Doses usuais e
são previsíveis. Não ocorrem para melhoria da situação patológica.
·
REAÇÕES ADVERSAS – Ocasionam
sintomas indesejáveis (ou mesmo toxicidade) ou dão lugar a interações
prejudiciais com outros medicamentos usados concomitantemente.
·
EFEITOS TÓXICOS – Reações
provocadas por uma dose excessiva ou por acumulação anormal do fármaco no
organismo.
· EFEITOS LOCAIS – Reações que só
ocorrem no local de administração do medicamento;
·
EFEITOS SISTÉMICOS – Efeitos
ocorrem num órgão ou sistema distante do local de administração;
· EFEITOS SINÉRGICOS – Combinação dos
efeitos de dois ou mais fármacos, administrados simultaneamente – efeito final
é superior à soma dos efeitos de cada um deles isoladamente. EX.: relaxante
muscular+analgésico
· EFEITOS ANTAGÓNICOS – Efeito oposto
entre dois fármacos. Ex.: potássio (frequência cardíaca) /
digitálicos(frequência cardíaca). Potássio antagonisa a potência do digitálico.
Fitoquímica
Uma das principais
características dos seres vivos é a Atividade Metabólica,
que consiste em um conjunto de reações químicas que ocorrem no interior das
células.
No caso das células
vegetais esse metabolismo é dividido em primário e secundário.
O Metabolismo Primário é caracterizado pelos processos metabólitos que desempenham
uma função essencial no vegetal, como fotossíntese, respiração e transporte de
solutos.
Os compostos
provenientes desse processo têm uma distribuição universal, como os
aminoácidos, carboidratos, lipídios, ácidos nucléicos e clorofila.
O resultado do Metabolismo Secundário origina compostos que não têm uma distribuição universal, pois
não são necessários para todas as plantas em sua totalidade e como consequência
podem ser estudados taxonomicamente a partir da quimiosistemática.
Esses compostos
mesmo não sendo necessários para que a planta complete o seu ciclo de vida,
desempenham um importante papel na interação das plantas com o ambiente.
Os Compostos Orgânicos, que não desempenham uma distribuição
uniforme e global nas espécies vegetais, são produzidos em larga escala e
parecem não ter uma função direta sobre o seu crescimento e desenvolvimento.
Tais substâncias
conhecidas como metabólitos secundários (especiais ou naturais) não apresentam
efeitos diretos sobre processos celulares primários como fotossíntese,
respiração, translocação de solutos e água, síntese de proteínas e assimilação
de nutrientes, dentre outros e diferem dos metabólitos primários pela
distribuição restrita no reino vegetal, sendo característico de um grupo de
espécies ou de um grupo de espécies relacionadas, enquanto os metabólitos
primários são de ocorrência universal (COSTA, 1978).
A química dos
vegetais encarrega-se em estudar e compreender como são estas substâncias
ativas, a sua estrutura, a sua distribuição na planta, as suas modificações e
os processos de transformação que se produzem no decurso de sua vida,
abrangendo os processos de preparação do remédio vegetal e o período de
armazenagem, dando suporte ao que chamamos de Fitoterapia,
utilização de recursos vegetais para fins medicinais.
Dentro dessa
perspectiva há muito tempo as plantas vêm sendo utilizadas pela sociedade
humana para fins terapêuticos onde suas propriedades tóxicas e curativas foram
descobertas na busca pela sobrevivência.
O uso de extratos de plantas com atividades
antimicrobianas desempenha um importante e fundamental papel em tratamentos
terapêuticos, uma vez que o uso indevido de Antibióticos Sintéticos acarretou a resistência de
muitos microorganismos à terapia convencional.
A Fitoquímica, no entanto, também tem uma estreita
ligação com a Farmacologia, estudos dos efeitos das substâncias medicinais
sobre o organismo humano, do mecanismo e da velocidade da sua ação, do processo
de absorção e eliminação, das suas indicações, isto é, do uso contra
determinadas doenças.
Além disso, nas
literaturas científicas envolvendo a ação de plantas medicinais, destacam-se
estudos de atividades anti-inflamatória e antiofídica (RECIO, 1995; ESTEVES,
2005).
O conhecimento sobre
as plantas acompanha a evolução do homem na Terra.
As Civilizações Primitivas adquiriram conhecimentos empíricos sobre a utilização das
plantas na sua alimentação e simultaneamente verificaram a sua toxicidade e
aplicaram-nas no tratamento de doenças, pois apresentam propriedades curativas.
Assim surgiu a Fitoquímica, ciência que estuda produtos químicos
provenientes do metabolismo dos vegetais, descrevendo o grande número de
compostos de metabólitos secundários produzidos pelas plantas.
A Fitoquímica é uma etapa muito importante da Farmacognosia, termo derivado de duas palavras gregas, pharmakon, ou droga, e gnoses ou conhecimento, que
caracteriza o estudo do uso, da produção, da história, do armazenamento, da
comercialização, da identificação, da avaliação e do isolamento de princípios
ativo, inativo ou derivados de vegetais.
Alguns desses
produtos são conhecidos por oferecer proteção contra ataques de insetos e
doenças aos vegetais, mas também apresenta uma série de benefícios à saúde
humana.
Por esse motivo o
estudo químico de plantas tem despertado ao longo da história o interesse de
farmacêuticos, químicos, médicos, agrônomos e mais recentemente de leigos, com
vistas à descoberta ou à justificativa das atividades daquelas usadas como
medicinais (MATOS, 1997).
O conhecimento, a
utilização de algumas plantas e os efeitos das drogas de origem vegetal foram
atentamente observados, até a sistematização do seu uso.
A utilização das
plantas pela população tem como evidência de sucesso a pesquisa científica, que
traz o conhecimento químico farmacológico e utilização terapêutica (MATOS,
1997).
De fato, o
conhecimento Etnofarmacológico
acumulado ao longo de gerações tem servido como base para o desenvolvimento de
Fármacos de grande relevância.
Os Metabólitos Secundários defendem os vegetais contra herbívoros e patógenos, sendo
divididos em três grupos principais os terpenos, os compostos fenólicos e os
compostos nitrogenados (VICKERY, 1981).
Os Terpenos são feitos a partir do ácido mevalônico
(no citoplasma) ou do piruvato e fosfoglicerato (no cloroplasto).
Os Compostos Fenólicos são derivados do ácido chiquímico ou ácido mevalônico.
Por fim, os Alcaloides são derivados de Aminoácidos Aromáticos
(triptofano, tirosina), os quais são derivados do Ácido Chiquímico, e também de
Aminoácidos Alifáticos (ornitina, lisina).
Dentre os produtos
naturais ativos que têm mostrado resultados mais eficientes na química
medicinal, pode-se destacar que aproximadamente 50% apresentam atividades
antitumorais (YUNES; CECHINEL FILHO, 2007).
Os estudos nessa
área aumentaram de forma considerável visto que ainda existe uma lacuna no
conhecimento da biogênese de tumores e mecanismo de ação para o controle ou
aborto dos mesmos.
Estudos
laboratoriais com produtos naturais são de grande importância considerando-se
que a incidência anual de câncer é estimada em seis milhões de casos (FERREIRA,
2006).
As plantas
possuem dois tipos básicos de Polímeros: os ácidos nucléicos (DNA e RNA) e as
proteínas.
Contudo existe uma
terceira classe de compostos que se assemelham aos polímeros, os terpenos.
Os Terpenos (ou Terpenoides) constituem o maior grupo
de produtos secundários.
As diversas classes
são, em geral, insolúveis em água e sintetizadas a partir de Acetil-CoA.
Exemplos de terpenoides incluem as giberelinas, os carotenóides e os piretroides
(ROBINSON, 1991).
Os Compostos Fenólicos são bem representados no nosso cotidiano através do sabor,
odor e coloração de diversos vegetais, que funcionam como atrativos para
animais que participam do processo de polinização ou de dispersão de sementes,
além de despertar o interesse do homem devido a sua importância na proteção às
plantas contra os raios UV, insetos, fungos, vírus e bactérias.
Há inclusive certas
espécies vegetais que desenvolvem Compostos Fenólicos para inibir o crescimento
de outras plantas competidoras (ação alelopática), o que pode explicar a grande
distribuição e adaptação ao meio terrestre.
No caso das Angiospermas, vegetais que produzem Compostos Orgânicos
Secundários em quantidade significativa, ocorre a presença da lignina, que dá
rigidez ao sistema vascular, ausente e reduzida em briófitas e pteridófitas,
respectivamente.
Quimicamente, os Fenólicos são definidos como substâncias que possuem
anel aromático com um ou mais substituintes hidroxílicos, incluindo seus grupos
funcionais (LEE, 2005).
Possuem estrutura
variável e com isso, são multifuncionais.
Existem cerca de
cinco mil Fenóis, dentre eles, destacam-se os flavonoides,
ácidos fenólicos, fenóis simples, cumarinas, taninos, ligninas e tocoferóis
(SHAHIDI; NACZK, 1995).
Nas vias metabólicas
desses compostos existem Enzimas que são
reguladas por fatores ambientais relacionados no nível nutricional, intensidade
luminosa e infecção por fungos, o que explica a variação na produção desses
compostos em uma mesma espécie.
Existe ainda outra
importante classe de compostos derivados de uma das Enzimas, a Fenilalanina
Amônio Liase (PAL), sendo representada pelos flavonoides, existente em elevada
proporção nas angiospermas.
Esses compostos
estão envolvidos principalmente na interação entre plantas e outros organismos,
como os agentes polinizadores, pois determinam a cor das flores e na proteção
contra UV.
A cor das flores é
determinada pela ação das Antocianinas, uma
classe de flavonoides.
As Antocianinas
apresentam uma boa solubilidade em água e para participarem da biossíntese de
flavonoides é necessária a ação de uma outra enzima, a Chalcona Sintase (CHS).
Alguns grupos
vegetais sofreram uma mutação nessa enzima, permitindo a origem ao acúmulo de Estilbenos, uma classe de compostos relacionados aos
flavonoides, que podem ter representantes relacionados a diminuir o risco de
doenças cardíacas.
Essa mesma enzima
participa ainda da formação de importantes Flavonoides como as Antocianinas,
Flavonóis, os Taninos Condensados e os Isoflavonoides, sendo os Flavonóis,
considerados uma enzima reguladora por serem precursores dos Taninos Condensados
e das Antocianinas.
Contudo, os Flavonóis, por si só, já desempenham um importante
papel absorvendo a radiação UV para proteção das plantas.
Os Isoflavonoides são também conhecidos como Fitoalexinas,
ou seja, uma classe de compostos com ação antipatógenos ou inseticida.
Os Taninos Condensados são compostos fenólicos solúveis em água são responsáveis pela
adstringência de muitos frutos, estando ainda relacionados a defesas contra
pragas por se ligarem a proteínas digestivas dos insetos.
Esses compostos
também são denominados Protoantocianidinas
devido ao fato de produzirem pigmentos avermelhados (Antocianidinas), após
degradação.
Os Compostos Nitrogenados são constituídos por uma grande variedade de metabólitos
secundários contendo nitrogênio na sua estrutura.
Eles incluem
moléculas bem conhecidas relacionadas à defesa vegetal contra a herbivoria,
como os alcaloides e os glicosídeos cianogênicos.
Algumas dessas
moléculas são tóxicas aos humanos, embora outras possam ser utilizadas no tratamento
de doenças devido a suas propriedades medicinais.
Os Metabólitos Secundários
Nitrogenados são produzidos a partir de aminoácidos do
metabolismo protéico (COSTA, 1978).
Os Alcaloides são compostos orgânicos cíclicos que
possuem pelo menos um átomo de nitrogênio no seu anel.
Na sua grande
maioria possuem caráter alcalino, já que a presença do átomo de N representa um
par de elétrons não compartilhados, embora existam alcaloides de caráter ácido,
como por exemplo, a colchicina.
Os Alcaloides são sintetizados no retículo
endoplasmático, concentrando-se, em seguida, nos vacúolos e, dessa forma, não
aparecem em células jovens.
Uma característica
comum dos Alcaloides é a presença de nitrogênio no anel carbônico.
Essa estrutura
indica que os Alcaloides são derivados de Aminoácidos.
MORFINA HEROÍNA ESTRICININA brucine
Essa classe de
compostos do Metabolismo Secundário é de extrema
importância pela presença de substâncias que possuem acentuado efeito no
sistema nervoso, sendo muitas delas, largamente utilizadas como venenos ou
alucinógenos.
Contudo, os Alcaloides também podem ser muito úteis para a
sociedade, pelo fato da descoberta de que os Alcaloides Vincristina e Vimblastina,
presentes em vinca (Vinca rosea), podem ser utilizados na cura de certos
tipos de câncer.
Além disso,
como os Alcaloides estão associados ao desempenho do sistema nervoso de
mamíferos, muitos remédios para distúrbios emocionais, um mal crescente na
sociedade moderna, são derivados deles (MANN, 2002).
Além disso, nas
plantas a Função da
Nicotina está associada à defesa contra herbívoros,
ela pode ser utilizada como inseticida natural e nas conhecidas caldas de fumo
empregadas na agricultura.
Outra classe de
alcaloides derivada da ornitina são os Tropânicos.
Entre ESSA classe dos
alcalóides é a cocaína.
O grande problema
associado à cocaína está no seu refino, o qual produz uma droga concentrada que
rapidamente provoca dependência química em seus usuários.
Outro representante
dessa classe de Alcaloides é a
própria Atropina, substância utilizada como um dilatador de pupilas em exames
de oftalmologia.
Ainda outros estão
relacionados a efeitos analgésicos, codeína e morfina.
Alguns Alcaloides não são derivados de Aminoácidos e sim de
uma base nitrogenada.
Esse é o caso da Cafeína, uma Xantina produzida a partir de uma
purina.
Atualmente há um
grande grupo de pesquisa em busca de moléculas ativas nas plantas.
Isso pode ser
evidenciado tanto na área acadêmica quanto na industrial.
Quando se procura um
princípio ativo não interessa o composto mais fácil de separar, ou aquele
encontrado em maior concentração ou ainda, aquele que possui a estrutura mais
complexa, o que interessa realmente é descobrir compostos que apresentem
atividade biológica, realçando a importância dos Estudos Fitoquímicos (YUNES;
CALIXTO, 2001).
Como já mencionado,
o principal papel dos Metabólitos Secundários é a proteção
contra pragas e patógenos.
Pode-se dizer que a
ampla variedade de compostos produzidos pelas plantas é o produto de milhares
de anos interagindo com os mais diferentes organismos.
A própria proteção
que as plantas tiveram que desenvolver contra a dissecação ao conquistarem o ambiente
terrestre, ou seja, a Cutícula
constitui-se numa defesa contra o ataque de fungos e bactérias.
A Cutícula possui uma camada mais externa denominada
cutina e uma mais interna chamada suberina.
Ambas as camadas
possuem ceras.
As Ceras são misturas complexas de lipídeos
bastante hidrofóbicos.
Essa repulsão de
água tem um papel ecológico importante, pois faz com que a superfície da folha
esteja seca impedindo a germinação de esporos de fungos e a multiplicação de
bactérias (PERES, 2004).
Muitas áreas estão
envolvidas na pesquisa de novas substâncias oriundas de plantas, como a Fitoquímica, que trabalha no isolamento, purificação e
caracterização de princípios ativos; a Etnobotânica
e a Etnofarmacologia, que buscam informações a partir do
conhecimento de diferentes povos e etnias; e a Farmacologia,
que estuda os efeitos farmacológicos de extratos e dos constituintes químicos
isolados (MACIEL, 2002; MENDONÇA-FILHO; MENEZES, 2003; VENDRUSCOLO; RATES;
MENTZ, 2005).
Na área da Agricultura Ecológica os ensaios laboratoriais constituem o primeiro passo para a
identificação de promissores produtos (DIAS, 2005).
Todos esses aspectos
remontam e justificam a enorme necessidade de conhecermos essa imensa Farmacopéia, contribuindo assim, para o uso adequado
das drogas vegetais que constituem propriedades preventivas, curativas, mas
também tóxicas.
Segundo o ANVISA / Ministério da Saúde, há uma
diferença entre Plantas
Medicinais e Fitoterápicos,
pois as Plantas Medicinais são aquelas capazes de aliviar ou curar enfermidades
e têm tradição de uso como remédio em uma população ou comunidade.
Para usá-las,
é preciso conhecer a planta e saber onde colher e como prepará-la.
Quando a
planta medicinal é industrializada para se obter um medicamento, tem-se como
resultado o Fitoterápico.
O processo de industrialização evita
contaminações por microorganismos, agrotóxicos e substâncias estranhas, além de
padronizar a quantidade e a forma certa que deve ser usada, permitindo uma
maior segurança de uso.
Os Fitoterápicos, produtos naturais industrializados, devem ser registrados na
ANVISA / Ministério da Saúde antes de serem comercializados.
Em janeiro de 2008, foi criado um grupo de
trabalho formado por técnicos da ANVISA e Ministério da Saúde para estudar a
legislação de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos
e propor um marco regulatório para atender ao disposto na Política Nacional de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos, considerando os serviços existentes, a
legislação sanitária vigente e os níveis de complexidade da Fitoterapia.
Todavia, há vários
problemas práticos, não previstos, que precisam ser solucionados para não
impedir o desenvolvimento do Brasil em pesquisas nessa área.
Há um consenso de
que deve haver a repartição de benefícios, com a realização de contratos (para
os quais ainda não há unanimidade) de utilização dos recursos-alvo.
O Tema da Bioprospecção encontra-se em forte discussão no Brasil, pois os
pesquisadores são unânimes quanto à repartição de benefícios, mas pedem justiça
e flexibilidade para que as leis não inviabilizem o progresso da pesquisa
(ALBUQUERQUE; HANAZAKI, 2006).
Foram realizadas
reuniões técnicas com a participação de: Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA), Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA), Fiocruz e Secretaria de Saúde do Distrito
Federal.
Em 22 de
abril de 2010 foi publicada, no Diário Oficial da União, a Portaria nº. 886/
GM/MS que institui a Farmácia Viva no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Sobre a Regulamentação do acesso ao Patrimônio
Genético e ao Conhecimento Tradicional
associado, o Ministério da Saúde participa das discussões no âmbito do Conselho
de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), composto por representantes de 19
órgãos e entidades da Administração Pública Federal e presidido pelo Ministério
do Meio Ambiente.
Por trás de todas essas considerações, que afirmam a
importância Ecológica da prospecção Fitoquímica
ainda existe a crescente preocupação com o ambiente e a consciência de que o
petróleo, a matéria prima das indústrias químicas, é finito, conduzindo, de
forma eficaz, à volta aos produtos naturais e total apoio à produção de Fitoterápicos.
“As Plantas
Medicinais “In Natura”, dependendo da quantidade correta e dosagens
administradas por pessoas que conhecem os seus tipos, seus usos e seus efeitos,
sem agrotóxicos, são muito mais eficientes, porque não perdem como no processo
fitoterápico ou Fitoquímico as suas substâncias naturais e nem a qualidade e
efeitos originais. (N/T)”.
Fitoterapia
O conjunto de conhecimento sobre
o uso de plantas forma hoje a “Fitoterapia
Popular” (ALBUQUERQUE E ANDRADE, 2005), uma prática exercida por
milhares de brasileiros, principalmente o de pouco acesso às práticas médicas
oficiais.
O termo Fitoterapia
vem do grego phyton – que significa planta e therapeia que encerra a ideia de
tratamento, etimologicamente significa tratamento por meio de plantas (PAULA,
2003).
A
descrição do uso de plantas por Guilherme Piso (1611 – 1678) é até hoje
usada na catalogação de herbários, mas, de onde teria o renomado médico e
naturalista retirado tamanha gama de informações acerca da farmácia brasileira?
Como teria ele identificado os sintomas e seus respectivos tratamentos com
medicamentos extraído da botânica brasileira?
Guilherme
Piso (1611-1678), foi um médico e naturalista holandês.
Participou como médico de uma
expedição nos anos (1637 – 1644), para o Brasil, com patrocínio do Conde Maurício de Nassau.
Seu nome em língua neerlandesa é Willem Piso ou Willem Pies.
Em latim,
como assinava suas obras, era Guilielmi Piso.
Escreveu com Georg Markgraf e
publicada originalmente por Ioannes de Laet a “Historia Naturalis Brasiliae.
Willem Piso ou Guilherme Piso ( 1611-1678)
Segundo informa o livro "Brasiliana
da Biblioteca Nacional", "a partir de (1638), colecionou plantas e animais
no Brasil, além de estudar doenças tropicais e terapias indígenas."
Em fins do século
XVIII, chega ao Brasil aquele que seria um dos maiores
contribuidores do estudo da Fitoterapia
Brasileira, Bernardino Antônio
Gomes, médico português que desembarcou na cidade do Rio de Janeiro,
vindo na qualidade de médico pessoal da princesa Leopoldina, então prometida a
D. Pedro I como esposa.
Fascinado com a enorme quantidade
de Fitoterápicos extraídos das matas e
selvas do Brasil, Bernardino resolveu se empenhar em não somente catalogar
botanicamente tais plantas, mas também estudar seus princípios ativos de que
tanto falava a população da época.
Apesar de pouco conhecimento
hoje, seus trabalhos somam considerável volume, dentre eles poderíamos destacar
os seus estudos sobre as raízes de pipi5 em 1798.
Anos mais tarde a observação de
Bernardino sobre os usos do “pipi” entre os escravos, foram comprovados por
Hoehne em 1939.
Segundo ele, o “pipi” hoje
catalogado como Pitiveira Allíacea, teria um princípio ativo anestesiante, daí
o uso popular em bochechos nas dores de dentes (GOMES, 1972).
As observações deste estudioso
acerca das práticas e uso das plantas brasileiras pelos escravos, no Brasil do
séc. XVIII, trouxeram valiosas contribuições às práticas de saúde brasileira.
No século XIX,
destacamos o eminente botânico francês Auguste de
Saint-Hilaire, que compôs um herbário de 7.000 espécies das quais
4.500 eram desconhecidas dos cientistas na época.
Em uma de suas várias incursões
pelo sertão brasileiro, depara-se Saint-Hilaire com uma pequena cidade situada na província das
Minas Gerais, de nome Sucuriu, sabendo então que na cidade se encontrava um
“estrangeiro” que estudava “plantas do sertão”, vários sertanejos se
prontificaram a lhe mostrar do cuidar da saúde desta população:
Esta planta, cuja raiz possui
efeito narcotizante, era usada em bebidas pelos escravos para “amansar” os seus
senhores.
Enquanto estava em Sucuriu,
diversas pessoas trouxeram-me várias plantas usuais, recebi-as principalmente,
de um bom ancião que conhecia grande número delas.
Como não existem nessa localidade
nem médicos, nem cirurgiões, os habitantes para se curarem experimentaram os
vegetais que tinha à disposição, e não existe colono, que não possua alcance a
esses medicamentos.
Assim, os nomes guaranis,
caapiá (Dastenta), ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha), sambaíba (Curatella
sambaúba), etc., designam suficientemente espécies cujo conhecimento é devido
aos indígenas; finalmente os nomes de padre-salema (Gomphrena officinallis),
quina de remijo (Cinchona remijian, Aug. De S. Hil.), ana-pinta (uma
cucurbitácia), são evidentemente os das pessoas que foram as primeiras a
empregar esses vegetais como remédios,
(SAINT-HILAIRE,1975,
GOMES, 1972).
O “bom ancião” a quem
Saint-Hilaire se refere, tratava-se muito provavelmente de um caboclo, um
entendido em plantas medicinais, o qual a população local recorria para cuidar
de seus problemas de saúde.
Observa-se então que a partir de
meados do Séc. XIX, um número destes
agentes ligados à população ribeirinha, rural e suburbana, começava a aumentar
consideravelmente, prova disso está nas palavras do autor que, ao se preocupar
com a origem dos nomes de certas plantas medicinais, como “pedra-salena,
quina-de-remijo e anapinta”, afirma que estas possuem nomes ligados aos seus
respectivos descobridores e usuários, afinal elas não possuem designações
guarani.
Neste sentido, destaca-se que um
saber relacionado ao cuidar começa a se manifestar na população brasileira.
A relação e a troca de
informações com o europeu, o indígena e o negro resultaram numa produção
multicultural.
É importante considerar que, tal
conhecimento do cuidar da saúde não surgiu simplesmente como um híbrido
nascimento da mescla de três culturas diferentes (europeia, indígena e a
africana).
Entretanto, fatores como o
isolamento causado pela distância da capital, a troca de víveres e instrumentos
de trabalho com indígenas, que então moravam mata adentro (prática esta feita
desde o primeiro contato do europeu com o índio americano), e a importação do
negro como mão-de-obra escrava, fomentaram situações em que as trocas de
informações acerca de qual remédio usar para picada de cascavel, ou qual raiz
esfregar no ferimento para este cicatrizar mais rápido, fizeram com que o
contato com o outro e com o conhecimento detido por este, se operasse.
Assim, os indígenas, quando
estabeleciam contato com o europeu e, posteriormente, com o caboclo, não
traziam somente o urucum e pau-brasil, para o escambo, eles sabiam que suas
ervas também possuíam valor de troca.
Já afirmava o historiador Holanda (1957) que:
foi certamente no contato assíduo do sertão e de seus habitantes, que o
paulista terá apurado as primeiras e vagas nações de uma arte de curar mais em
consonância com nosso ambiente e nossa natureza.
Só a larga e continua
experiência, obtida à custa de um insistente peregrinar por territórios
imensos, na exposição constante a moléstias raras, a ataques de feras e vindas
de gentio inimigo, longe do socorro dos físicos, dos barbeiros sangradores ou
das donas e curandeiros, é que permitiria ampliar substancialmente e organizar
essa farmacopeia rústica.
Deste modo, as condições de vida
a época, forçado ao sertanejo sugeriam-lhe inúmeros recursos de emergência com
que pudesse lançar mão, indo à casa de seu vizinho que guardava raízes e folhas
secas, atrás da porta da cozinha da fazenda, uma rápida incursão à mata,
cerrado ou caatinga.
A necessidade e os recursos de
que se dispunha o sertanejo, fazia com que os instrumentos de socorro
estivessem sempre à mão.
Desse modo, o mesmo fogo que
servia para moquear ou cozinhar a carne de caça, também era “cauterizador” de
feridas.
No Brasil a Medicina Popular
e o conhecimento específico sobre o uso de plantas são resultados de uma série
de influências culturais, como a dos colonizadores europeus, dos indígenas e
dos africanos (ALBUQUERQUE; ANDRADE, 2005).
Os descobrimentos e a conquista
de novas terras pelos colonizadores, tiveram diversas consequências.
Uma delas, provavelmente a mais
notável, foi o fato de que muitas plantas hoje empregadas na medicina popular
foram introduzidas no início da colonização do Brasil.
Ao lado da Flora Medicinal
“colonizadora”, encontra-se a planta medicinal dos indígenas pois, para
Albuquerque e Andrade (2005) “são profundos conhecedores dos recursos da
floresta, sejam elas medicinais ou não”.
Com a pressão dos colonizadores,
fez com que o conhecimento dos índios e dos africanos fosse abandonado, uma vez
que muitos consideravam inferior ou primitivo.
Os grupos indígenas e africanos
foram resistentes, e o quadro mudou ao longo dos tempos.
No que se refere especificamente
à Amazônia, existem muitas citações
esparsas sobre virtudes curativas atribuídas a determinados vegetais, e os
pioneiros dessas pesquisas muito contribuíram ao despertar o interesse sobre o
assunto, e em divulgar os conhecimentos sobre as espécies medicinais
amazônicas.
Entre esses devem ser destacados:
Matta (1913), com a “Flora Médica Brasiliense”,
em que ressalta a importância de serem estudados, metódica e cientificamente,
as plantas da Amazônia num trabalho conjunto de botânicos, químicos, biólogos,
farmacólogos e clínicos.
Nas áreas indígenas do Amapá,
destacamos o trabalho de Cavalcante e
Frikel (1973) que vem realizando um estudo sobre a Farmacopeia dos Índios
Tiriyó.
Paulo Bezerra Cavalcante (1922, 2006)
PROTÁSIO FRIKEL - (1912 – 1974)
Quanto a pesquisas na área dos Waiãpi que vivem na Guiana Francesa, destacamos uma das
obras de Pierre Grenand, (1987) com “Phamacopées Traditionalles em Guyane”.
PIERRE GRENAND (1987)
Tratando-se de plantas
medicinais outros grupos indígenas estão em evidencias no avanço de pesquisas
com plantas medicinais, gratos pelas práticas tradicionais de uso, são os
índios Krahô, situados na reserva Kraolândia, no Estado de Tocantins, segundo,
Pivetta, (2001,).
Eles dispõem em sua reserva de 164 espécies
vegetais utilizadas com fins medicinais, das quais 138 podem ter alguma
influência sobre o sistema nervoso central e, portanto, teriam a capacidade não
só de curar males físicos como indisposição e picada de cobra.
Tribo Índios KRAHÔ
Observa-se que os estudos com
plantas medicinais estão avançando em outros grupos, e é
importante destacar a participação da “Mulher Indígena”, uma das
responsáveis de passar aos seus descendentes essa sabedoria que a milênios vem
sendo desenvolvidas.
FARMACOBOTÂNICA
Droga Vegetal: Órgão
ou parte da planta que contém substâncias ativas que vão ser usados como medicamento.
Fitoterápicos: São
medicamentos obtidos através das Plantas
Medicinais empregando exclusivamente drogas vegetais.
Plantas Medicinais: Qualquer vegetal que
contenha alguma substancia que possa ser utilizado como fins terapêuticos.
TECIDOS
Meristema Primário: Presente na planta em
crescimento.
Responsável pelo desenvolvimento da planta a partir da
semente.
Forma outros tecidos.
Está presente nas extremidades
da raiz e do caule.
A Célula Meristemática é capaz de regenerar-se e formar
uma nova planta.
É rica em óleos, substancias como amido.
Meristema Secundário: Originado de Células Adultas do Parênquima.
Proporciona Crescimento em Espessura: Gimnosperma (Pinheiro, samambaia...) e Dicotiledôneas (estão dentro do grupo das
angiospermas).
Mas somente as Dicotiledôneas
podem crescer em espessura e tem dois 2 tecidos de revestimento: São tipos de Meristemas Secundários: Felogênio – externo e Cambio Vascular – Tec. Vascular Secundário que dá
origem ao Xilema e Floema na planta adulta.
TEC.
DE REVESTIMENTO:
Epiderme:
Presente em Tec. Jovens.
Possui uma camada mais fina e tem menos células.
Vem de Protoderme.
É recoberta por Cutículas (Cera+Cutina).
Periderme: Presente
em Tec. Maduros.
Possui camada grossa e tem mais células.
Substitui a Epiderme em tecidos com crescimento
secundário.
Formada pelo Felogênio que se divide em 2 tipos: Súber – é um tecido morto com células e
paredes secundarias lignificadas e Feloderma
– é um Tecido Parenquimático
(jovem).
Estruturas
Anexas: Tricomas
(folhas), lenticelas e estômatos (estrutura da planta que permite as trocas gasosas como
entrada de CO2 e saída de O2 e também respiração.
TEC. VASCULAR:
Xilema
ou Vasos Lenhosos: Transporte de água e
sais minerais da raiz para as
partes superiores da planta.
Conduz Seiva Bruta. Está localizado internamente.
Floema OU Liber OU Vasos liberianos : Transporte de substâncias orgânicas DOS Órgãos fotossintetizantes (Folhas) mesmo como regions de consumo e armazenamento.
Conduz Seiva elaborada.
Possui certa continuidade entre as Células (placas
crivadas) permite a passagem de seiva.
Este localizado externamente.
TEC.
DE PREENCHIMENTO:
Parênquima: Formado por células
com função de produção de substancias, armazenamento, regeneração de tecidos,
preenchimento e sustentação.
Rico em Plasmodesmos.
Tipos: Clorofilianos – Presente nas folhas; de reserva; de preenchimento e Aerênquimas – Armazena ar para flutuar na água.
TEC.
DE SUSTENTAÇÃO:
Esclerênquima: Formado
por Células Mortas com paredes secundarias rígidas e impermeáveis devido a
lignificação.
Presente em planta madura. Tipos: Fibras e Esclerídios.
Colenchyma: Formado por células vivas COM paredes primárias finas e Flexíveis.
A Casca mesmo sendo ‘’ produto morto’’
produzem substancias ativas porque durante a fase ativa elas armazenam nutrientes.
Gutação: É
quando a planta perde água.
Plasmodesmos: Estrutura
que une as células vegetais permitindo a comunicação com células
vizinhas.
Lignina: É
uma substancia que endurece a célula (polímero) tornando o vegetal mais rígido.
Giberelina: Hormônio
sintetizado pela raiz.
Plantas Briófitas : lama.
Plantas Pteridófitas: Samambaia.
Plantas Superiores : Angiospermas (frutos) e gimnospermas (flores).
Amidos: É
glicose em forma de polímeros anovelados.
Epífitas: Plantas que vivem sobre a outra.
Tipos: Parasitas e Hospedeiras.
A Planta se Defende produzindo toxinas.
ROOT
Órgão adaptado a absorção de água e nutrientes do solo (Nitrogênio, Fosfato, Ferro, Magnésio, Cálcio);
O que permite que a raiz absorva água é a presença de Pêlos Absorventes na Epiderme;
Os Pêlos São Células que se projetam na epiderme;
Zona Pilosa: Principal
rede de absorção de água;
Zona Suberosa: É
uma zona velha, impermeável, nascem as raízes laterais;
Zona Lisa: Responsável
pelo crescimento primário da raiz;
Colo: Região
de transição entre a raiz e o caule;
Coifa: Protege a raiz;
No Cilindro Central tem Xilema e Floema revestido pela Endoderme;
Funções: Armazenamento
de amido, água, síntese de hormônios e produção de princípios ativos.
Classificação: Raiz
Primária ou Principal –
Origina-se do embrião, é a primeira raiz da planta, dá origem a Raiz Secundária ou Lateral –
Origina-se da raiz primaria, surge na
planta já estabelecida no solo, podem ramificar-se extensamente formando a
principal rede de absorção da planta.
Raiz área –
Projetam-se do solo para auxiliar na fixação ou absorção de O2.
Raiz Aquática
Raízes Subterrâneas –
Principal tipo de raiz.
Raízes Típicas
Raízes Tuberosas ou de
Reserva.
CAULE
Eixo que transporta as folhas.
Geralmente Aéreo especializado em condução e sustentação.
Pode também ser um órgão de reserva.
Serve para propagação vegetativa.
Tem Geotropismo
(crescimento em relação com a
terra) negativo e Fototropismo
(crescimento em relação com o sol) positivo.
Tubérculo: Tipo
de caule subterrâneo;
Órgãos anexos: Acúleos – projeção da epiderme; Espinhos – estrutura rígida, projeção do caule
interno.
Planta Rasteira: Não
ultrapassa 1 m de comprimento. São monocotiledôneas.
É onde se encontra maior concentração de princípios ativos
porque faz fotossíntese.
Planta arbustiva : Tem entre 1,5 me 3,5 m de altura.
Planta Arbórea: Tem mais de 3,5 m de
altura. São as dicotiledôneas.
DESENVOLVIMENTO:
Ervas: Caule
com pouco ou nenhum tecido lenhoso;
Arbustos: Caule ramificado a partir de um banco de dados . Ex: Jabuticabeira;
Arvores: Lenhosos,
parte avantajada (tronco).
TIPOS:
Caules aéreos
Caules Rastejantes
Caules Subterrâneos
FOLHAS
São Projeções do Caule especializadas no Metabolismo Fotossintético;
Possuem imensa Diversidade de formas;
São adaptadas ao Tipo de Ambiente que a planta vive;
São Órgãos com maior atividade metabólica na planta;
As Folhas se regeneram mais rápidas do que o restante da
planta;
Quanto mais Clorofila melhor será a atividade da planta;
Pecioladas Planta : Possuem pecíolo;
Plantas Sésseis: Não
possuem pecíolo;
A face superior
da folha é chamada de axial e a inferior abaxial;
Mesófilo: Conjunto
de tecidos/células no meio da folha;
Anel Vascular: Xilema
e Floema organizados presentes na nervura da folha.
Heliófila: Folhas
de sol. Possui grande quantidade de parênquima;
Esclerídios: Estrutura
usada no controle de qualidade por possuírem grande quantidade de armazenamento
de minerais.
ESTRUTURAS
BÁSICAS:
Limbo: Tecido Parenquimático (rico em clorofila) + Epiderme (pode ter células armazenando
cristais);
Nervura: Tecido
vascular + Tecido de Sustentação. Organização do xilema e floema;
Pecíolo: Tecido
de Sustentação. Pode aparecer ou não na planta;
Bainha: Tecido
de Sustentação. União ao Caule.
TIPOS:
Xerófitas: Folhas
de plantas que vivem em ambientes secos.
Possuem Folhas Pequenas e grandes camadas de Cutina. Ex:
Cacto;
Mesófilas: Folhas
de plantas que vivem em ambientes úmidos.
Tem Folhas Grandes, armazenam água, e tem a cutina mais
fina;
Hignofilas: Folhas
de plantas de ambientes muito úmidos.
Possuem Folhas Grandes e não tem cutina, armazenam água e
são plantas mais verdes.
FLORES
4 Verticilos: Cálice, Corola, Androceu (formação de Gametas Masculinos = Estames) e Gineceu
(formação de Gametas Femininos = Carpelos).
Todos os Verticilos são formados a partir de folhas
modificadas: os Antofilos;
Nucelo: Tecido
nutritivo do ovulo que envolve o saco embrionário;
Micrópila: Abertura
superior do ovulo;
Saco Embrionário: Composto
por 7 células – Oosfera, Sinérgides, Antípodas e o Mesocisto com 2 núcleos
polares.
Polinização: É
a transferência do grão de pólen até o Estigma;
Grão de pólen: Gameta Masculino;
Óvulo: Gameta Feminino;
O Grão de Pólen pode ser transportado através de Morcegos
(quiropterofilia), Insetos (entomofilia), Pássaros (omitofilia), Água (hidrofilia),
Vento (anemofilia).
Perianto: Sépalas
e Pétalas diferentes;
Perigônio: Sépalas
e Pétalas iguais na cor e tamanho chamadas de Tépalas;
Aclamídea: Não
apresenta nenhum dos Verticilos Protetores (Cálice e Corola);
Plantas Monóicas: Possuem
os 2 Sexos no mesmo pé. São mais comuns;
Plantas Dióicas: Possuem Sexos em flores diferentes;
Verticilos Florais Férteis: Estames
e Carpelos;
Verticilos Florais Estéreis: Sépalas
e Pétalas;
Combinado por Carpelos : gineceu;
Conjunto de Estames: Androceu.
ERVAS MEDICINAIS
RAÍZES MEDICINAIS
SEMENTES
VEGETAIS
Tubérculos
FRUTAS SECAS
Antioxidantes
CHÁ MEDICINAL
SHAKESPEARE
“Oh! Imensa é a
graça poderosa que reside nas Ervas e em suas raras qualidades, por que na terra não existe
nada tal vil que não preste à terra algum benefício especial.
Dentro do terno cálice
da débil Flor
residem o Veneno e o Poder Medicinal”.
William Shakespeare .
(Cena III, Ato II de Romeu e Julieta, 1564-1616)
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